Jardim do Pentapolen

O Homem-que-não-pede-desculpa

Todo mundo já conheceu um homem-que-não-pede-desculpa. Todo mundo já teve que lidar com um homem-que-não-pede-desculpa. Todo mundo já teve que controlar a própria raiva pra não dar na cara de um homem-que-não-pede-desculpa.

Mas o homem-que-não-pede-desculpa não é incapaz de pedir desculpa. Ele pede desculpa pra mãe, mas não pra esposa. Pra esposa, mas não pros filhos. Pro chefe, mas não pros colegas.

O homem-que-não-pede-desculpa não é uma pessoa, necessariamente, mas um estado de espírito. E esse estado de espírito é a da constante dissonância cognitiva.

Dissonância cognitiva é um desses termos científicos muito falados mas pouco entendidos, geralmente usados só pra esconder o xingamento de burro. Mas a dissonância cognitiva não significa que a pessoa está errada. O fenômeno é o desconforto que sentimos quando temos ideias ou crenças que percebemos como conflitantes. Isso pode acontecer quando já temos uma crença estabelecida mas descobrimos algo novo, que nega tal crença.

Esse tipo de dissonância cognitiva se resolve de três formas: ou o sujeito aceita a nova informação e muda sua crença sobre o mundo; ou ele tenta sustentar as ideias incompatíveis e começa a sentir culpa; ou, por último, ele tenta negar a nova informação.

O homem-que-não-pede-desculpa escolhe a terceira resolução. Ele escolhe negar a realidade que aparece. Mas qual seria essa nova realidade que tanto amedronta o homem-que-não-pede-desculpa? A realidade de que você está no mesmo nível que ele.

O homem-que-não-pede-desculpa pede desculpa pra mãe, mas não pra esposa, porque a mãe dele ele respeita; mas não a mãe dos filhos dele.

É aí que mora o grande horror do homem-que-não-pede-desculpa. Ter que se rebaixar ao mero mortal que você, pessoa leitora, é. Para pedir desculpa, ele teria que admitir que você é tão talentosa quanto ele, tão inteligente quanto ele, que pode fazer o que ele faz.

Mas, e sempre há um mas, existem situações em que o homem-que-pede-desculpa aceita que está errado, passa pelo processo de culpa, e finalmente pede desculpa.

Aí não há quem segure o homem-que-está-pedindo-desculpa.

Serão as maiores e mais bem escritas desculpas do mundo. O homem-que-está-pedindo-desculpa brilhará em suas letras, suas lágrimas e seu novo modo de ver o mundo. O neófito da humildade será o mais humilde dos humildes. Falará tudo o que deve ser falado para todos ouvirem... (não exatamente todos). Como um xiita em Teerã, ele se autoflagelará e sentirá toda a dor que causou em você, talvez ele sentirá mais dor do que causou em você! (Ele nunca sentirá mais dor do que causou em você).

Isso porque o homem-que-está-pedindo-desculpa não permitirá que a história seja lembrada com você sendo vitimada e depois perdoando. Não. O homem-que-está-pedindo-desculpa quer que a história seja lembrada (não por todos, não para sempre) com ele sendo uma pessoa que errou, mas que se redimiu.

O homem-que-não-pede-desculpa faz questão de mostrar que é mais talentoso que você, mais inteligente que você, que ele é mais importante que você, mesmo quando ele pede desculpa.

#masculinidade #pensamentos